03/12/2007

As Flores

As flores são bonitas. As flores têm muitas cores. As flores vivem nos campos e nos vasos da minha mãe. Também já vi muitas flores a viverem nos supermercados e nas mãos de senhores muçulmanos. Mas os senhores muçulmanos vendem só dez flores, e tudo a dois euros. Eu até posso só ter 9 anos, mas a minha avó dá-me cinco euros de mesada e não me chega para as gomas, por isso juntando dois mais dois, noves fora (que eu sou boa aluna a matemática), acho que o senhor muçulmano não ganha para os campos e vasos onde as flores vivem. Em vez disso eu acho que eles vão buscar as flores aos cemitérios, que eu as vezes vejo-os á noite a saltar de campa em campa. A minha mãe também diz que só podem ser eles, já que nos rituais Satânicos não se usam brincos pisca-pisca. Eu até acho que é bem pensado, já que os mortos não agradecem as flores e os vivos que lá vão têm os olhos demasiado embaciados com lágrimas para verem qualquer cor que as flores possam ter. Como a minha avó diz, é mal-empregado, já para não falar das abelhas todas lá de volta, que não devem deixar os mortos dormir em paz com tanto zumbido. Quando eu for morta não quero cá flores, porque depois não me posso mexer para enxotar as abelhas, e se assobiar, provavelmente engulo terra.

Eu não sei muito bem, mas gostava de saber se existem flores em forma de pessoas. É que já mais que uma vez que oiço homens chamarem florzinha de merda ao meu pai quando ele sai à rua com os seus mocassins púrpura. Não percebo muito bem, se o meu pai fosse uma flor fazia chichi em pé porque as flores nunca se sentam, e não é isso que sucede.

As flores cheiram bem. As flores ás vezes fazem espirrar. Por isso também não percebo porque é que fazem lenços de papel com cheiro a flores para as pessoas que estão constipadas usarem.

As flores dão para fazer mel, chás e também servem de meio de transporte . Eu sei isso porque ás vezes oiço o meu irmão mais velho dizer aos amigos que viajou até bué longe com o pólen que ele comprou. Eu não sei como é que ele conseguiu fazer isso sem que nenhum de nós lá de casa desse conta, mas só sei que nos enganou muito bem. Acho que tenho muito a aprender com ele!

Há quem ofereça flores por várias razões: os filhos oferecem aos pais quando fazem anos, os rapazes oferecem às meninas quando querem namorar com elas, toda a gente oferece aos mortos quando eles morrem e todos os clientes oferecem às gestoras de conta porque é assim, ou pelo menos é o que diz a minha mãe todas as semanas quando recebe flores lá em casa de vários homens diferentes. A minha mãe deve ser uma grande gestora! Por isso e que quase nunca está em casa!

As flores são muito bonitas e eu gosto muito delas!

26/11/2007

Choice of Weapons

Quando a nossa professora de Inglês Criativo nos dá um poema extremamente original como este

Sticks and stones are hard on bone
Aimed with angry art
Words can sting like anything
Silence braks the heart

e nos pede para fazermos o que quisermos com ele, para além da imagem visual imediata que tenho das minhas mãos a amarfanharem o papel com a dita quadra e a atirarem-no para o mais próximo do horizonte possível, surgem outras ideias igualmente parvas como esta




E tenho dito! Tó Brigada.

18/11/2007

Glossário de Algibeira

Javali (segundo o meu petiz irmão de 5 anos) : Porco em forma de ouriço.

Pois claro! Assim não restam margens para dúvidas! Claro como a água!

O mundo seria tão mais bonito se toda a gente passasse a dizer "pequena égua ruça de chifres" quando se quisesse referir a uma cabra...

08/11/2007

6º Mistério - O d'O Dialecto Infantil

Parece-me a mim que já quase toda a gente foi criança algures na vida! Uns numa época, outros noutra, mas um fenómeno curioso é que, ao contrário das indumentárias, cortes de cabelo, modas de nomes, há duas coisas que permanecem invariavelmente intemporais e intocáveis: as pirraças e as lenga-lengas.

Vamos por partes:

Lengalengas - Desde que me conheço a mim, a minha mãe se conhece a ela e o meu irmão igualmente (ainda que mal, que ele acha que é uma vulgar criança de 5 anos mas na verdade esconde em si o Senhor das Trevas), que cantamos as mesmas músicas enquanto marcamos o compasso com palmas numa rodinha de piquenos. Quem não conhece o " Se tu visses o que eu vi, oh dominó", ou mesmo o "Era uma velha-lha, que tinha um gato-to"? Aposto que o Sancho Primeiro ainda mal sabia manejar a espada, já ele entoava o "Enrola o melão, desenrola a melancia" juntamente com os outros seus irmãos e infantes, Afonsinho, Urraca e Teresinha. Não se vê logo que o "A-ona-ona-" é indiscutivelmente Português arcaico a descair para o Latim?!

Pirraças e ofensas - Todos sabemos que as crianças ainda não compreendem em si uma série de bases e alicerces gramaticais, sintácticos e semânticos. A conjugação verbal nem sempre ser perfeita, e as sílabas ainda têm um carácter móvel dentro das palavras. Mas ainda estou por descobrir qual o mecanismo Freudiano ou esquizofrénico que os faz conceber e apregoar insultos como:

  • Mariquinhas pé de salsa (porque os molhos de ervas aromáticas em geral são extremamente comoventes)
  • (...) O teu pai é jacaré (e tu és um mutante cromossómico)
  • Lava a cara com chulé (amacia a pele e dilata os poros)
  • Songa-monga (nem Pessoa faria rimas melhores)
  • Rebenta a Bolha (porque é um fenómeno extremamente periogoso para todos os utentes da via pública e há que deixar tudo o que estão a fazer)

Enfim, muitos mais existirão de que não me recordo agora, mas que apelo desde já para que qualquer expressão desta estirpe que considerem merecedora de partilha, deixem por favor num comentário, de forma a enriquecer este documento.

07/11/2007

5º Mistério - O d'O 93

Olhares atentos, clima de tensão, batimentos cardíacos irregulares, tiques nervosos, jogo de futebol. É este o cenário macabro, mas apenas para alguns dos presentes, claro está, que na outra ponta do sofá estou eu, numa postura descontraída, provavelmente a arranjar as unhas ou a aproveitar aquela fabulosa oportunidade para roubar as chaves do carro a alguém e ir fazer uma escapadinha às termas do Gerês. É que naqueles 90 minutos toda aquela gente parece congelar no tempo e numa dimensão paralela, e eu até poderia fazer-lhes pinturas faciais, traficar droga ou vandalizar-lhes a casa mesmo à sua frente, que só dariam conta disso ao apito final do senhor árbitro.

Eu sinceramente, não me ralo. Só me junto à família porque seria um desgosto por demais para o senhor meu pai saber que a primogénita não apoiava o Sporting Clube Portugal. Valha-lhe Deus Nosso Senhor! Então pronto, lá fico eu gozando daquele momento só para mim em que ninguém me há-de chatear, e quando ocasionalmente o meu pai ou alguém desce à terra por questões de primeira necessidade apenas, lá entro eu na personagem, atiro um sonoro e enfático : "É FORA DE JOGO! LADRÕES! ÁRBITRO FILHO DA PUTA! " e pronto, toda a gente acredita e o meu pai fica muito orgulhoso de mim!

Mas entre estes serões em família extremamente saudáveis e de comunhão exemplar, vou reparando em alguns pormenores daquele entretenimento demoníaco que é o futebol.
Entre coxas, gémeos, comentários estruturados em frames de 0.0002 segundos, e dinheiro para limpar rabos, o que MAIS me intriga É..... o prolongamento.
É verdade... em toda a minha experiência de espectadora de pelada (que confesso não ser das mais atentas e fiéis) , nunca vi um jogo que terminasse de facto, aos 90 minutos como previsto. Há sempre 3 minutinhos a mais, aqueles 3 minutinhos mesmos feitos à medida do Bypass, aqueles 3 minutinhos em que tudo pode mudar e em que o mundo pode acabar!

Ora, pergunto eu aos meus botões que eles são mais sábios que eu, se não valeria mais a pena parar o cronómetro nos tempos mortos, e pronto vá, determinar os jogos para os 93 minutos, porque no fundo a gente até gosta e sempre dá para mais uma mini e uma mão cheia de tremoços!

16/10/2007

Até Os Cães Me Atraiçoam. O Que Me Torna Cada Vez Mais Semelhante a Cristo ='D

Entre muitas outras patologias, que o raio do canídeo parece estar amaldiçoado, consta que a Fiona tem carênica de Sal.

Onde é que isto é relevante, perguntam vocês?

Ela passava todo o seu tempo útil a lamber-nos cada poro quadrado de pele.

Afinal não era carinho e devoção. Era só interesse.

Sim, e deve querer significar algures que suamos muito... Ahh, benditas raízes latinas.

09/09/2007

Deus Tirou Férias.

Cristo está na Polinésia Francesa. É verdade! A igreja não pára de me surpreender. A minha avó, devota cristã, pôs-me hoje a par de uma situação um tanto ou quanto caricata: está bem que estamos em Setembro, e até que estão uns dias quentes, mas daí à igreja fechar para férias, francamente!

Imagine-se só! Está ali um praticante com um pecado ou dois entalado da goela, a ser massacrado com a sua consciencia celestina, e o senhor Prior a bronzear-se do pescoço para baixo algures na Praia dos Tomates. Andam as beatas e as velhinhas a contribuir com tanta dedicaçao nas esmolas para pagar uma semana num Resort de luxo a cada um dos acólitos! E pronto, ao fim de duas semanas lá volta o Senhor Padre à paróquia com uma tez bem mais bronzeada.

Digam-me lá, vá, quem é que distribui o corpo de Cristo para nos salvar do mal? Ah espera, se calhar puseram um doseador de hóstias à porta, daqueles com um Insert Coin, como fazem com os preservativos quando as farmácias não estão de serviço!

E a água benta, quem é que a benze? Fica lá a apodrecer na Pia Baptismal, a criar colónias de fungos e bactérias?

Será que quando o Clero tira férias de Deus, trocam o hábito por camisas com motivos florais e sungas malandras? Que é como quem diz, que aproveitam e têm duas semanas de puro pecado e sacrilégio? Já imagino o sacerdote rodeado de bifas e a benze-las de alto a baixo.

Logo hoje que eu nem me importava de ler o envagelho...

28/08/2007

Seja Feito Feriado

Vou instituir a partir de hoje, para todos os meus fiéis seguidores e devotos, dia 26 como dia Santo, e como tal deve ser celebrado a cada mês com alegria e fulgor. Tem-se revelado bastante próspero a diversos níveis. Deram-me uma licensa para matar em 4 rodas, peça fundamental para poder concretizar todos os meus planos malvados; encontrei um Jeremias perfeito para dar caldos e belinhas sem justificação aparente; e por fim, a razão da minha cozinha estar forrada a papéis de jornal e de acordar as 7 da manhã – não, não são obras nem infiltrações, comprei foi um cão. Com pipi.

Graças a qualquer coisa! Desde criança que sonhava com um canídeo para me aquecer os pés de noite e para eu descarregar pontuais surtos de afecto. Finalmente alguém ouviu as minhas preces e eis que surge uma bola de pêlo andante para me salvar das Trevas!
Pesa 700 gramas, anda neste mundo a lançar charme há 3 meses humanos, parece uma raposa mas diz que é cadela. Se bem que há uma protuberância curiosa na zona pélvica, que eu rezo para que seja algo semelhante a restos de cordão umbilical ou assim, porque há já dois dias que lhe ando a chamar Fiona e dorme numa alcofa cor-de-rosa. Eu pessoalmente se fosse rapaz não gostava.

É quase bípede, a avaliar pelo tempo que passa nas duas patas traseiras. Uma pequena fera, temperamento arisco mas carinhoso, dona do seu focinho e dos demais, está agora sentada ao meu colo gratuitamente! Faz mijinhas do tamanho de uma moeda, que ela deve achar algures no seu intelecto que ficam muito bem com a carpete da sala! A minha mãe não estava nada convencida, mas já a apanhei em flagrante delito, agarrada a ela e a grunhir algo como “bilu bilu cutxi cutxi” que nem eu que estou toda apaixonada me dou à coragem de proferir.

É um Lulu da Pomerânia, na gíria, um ratinho com Pedigree! Eu não gostava muito de cães de bolso, mas esta raposa derreteu-me! Não ladra, e terá eternamente ar de cachorro! Já me imagino qual Paris Hilton, passeando nas ruas da Baixa vestida de cor-de-rosa- “Cheguei”, com a sua cabecinha felpuda a sair da pochete e opinando sobre os modelitos das montras. Ok chega de dispersão fútil e inútil.

Não pensem que é um mero animal de companhia! Tem muitas outras funcionalidades! Para além de me instituir algum sentimento maternal e de responsabilidade, é um excelente cão de guarda, bem feroz e medonho! Os caninos dela trespaçam qualquer bolacha maria que se lhe atravesse à frente! Por isso aposto que com os pulos que ela dá, qualquer escroto de um bandido é rosbife para ela. Serve também de espanador para cantos difíceis, e em caso de miséria renderá certamente uns bons trocos no circo ou a segurar copinhos no meu ombro enquanto eu toco concertina na Linha Azul do Metro de Lisboa.

Teve uma história atribulada. Basicamente comprei-a em saldos! Ou coisa que o valha. Já há algum tempo que a andava a engatar na montra da loja do Centro Comercial. Sempre a morder as caudas dos primos, e a saltar de cubículo para cubículo. Mas pediam muitos Euros por aquele nico de bicho. Na ordem das 6 centenas de tustos! E eu tábem. Nisto desatei a ligar a criadores da raça, na esperança de encontrar bichinhos igualmente apetitosos mas com valores bem mais modestos. Só consegui falar para um, que pedia metade do preço. Aí já me soou melhor. Mas ainda assim, não era Aquela que eu tinha embeiçado. Mas pronto, 300 Euros ainda dá para muitos Martinis, lá engoli em seco e perguntei onde poderia ver os cachorros. Ao que do outro lado da linha, o indivíduo me responde em tom de secretismo: “Olhe, eu não os tenho agora comigo, mas passe discretamente pela loja de animais do Fonte Nova”. Ora o Fonte Nova não é grande, e só uma das lojas é que cheira a pássaros. Juntanto dois mais dois, noves fora, eu diria que a loja era a mesma. Não é que neste raio de país piqueno, o criador que eu fui ligar, era precisamente o criador dos cães que estavam em exposição na loja? Ele foi lá buscá-la e vendeu-nos ao preço de fábrica. PIÇADA NA LOJA, TOMA E EMBRULHA!

Sempre disse que o Poder Divino ainda me iria vir a dar jeito!


27/07/2007

Glossário de Algibeira

Estrelas-cadentes: Beatas que Deus manda para o ar quando não tem um cinzeiro à mão.

Corolário nº1: Deus Fuma.
Corolário nº2: Deus vai ter morte lenta e dolorosa.




2-0*

24/07/2007

Vox Pop

O povo português não pára de me surpreender. Até lacrimejo!

Hoje, ia eu de bem com a vida a entrar numa loja de sapatos ali para os lados da Charneca, quando presenceio um momento de glória popular:

Cliente (senhora de aparência rural a avaliar pelas unhas maltratadas, pornúncia singular, odor intenso e bigode farto) :
- Olhe ó menina eu queria um par de sapatos, saixabore.

Empregada: Muito bem. Então e para que é que procura os sapatos, exactamente?

Cliente: Olhe eram assim para andar!


...


(pausa de reflexão)

Ora desta é que eu não estava a espera! Sapatos para andar? E eu que sempre julguei que fossem para usar como brincos ou para guardar as moedas pretas ao fim do dia. Ou para suportar velas ou pousar a colher de pau!

Agora para andar?!
Francamente. Ele há com cada uma...

23/07/2007

4º Mistério - O d'A Praia

Julho, Verão, férias (para os mais afortunados), sol em quantidade, roupa em raridade, bronze em prioridade, e numa regra de três simples, assim como todos os caminhos estão para Roma, todos os dias estão para a praia.

E durante as muitas sessões de solário natural às quais me entrego de alma e coração sob juramento de fidelidade, qual réptil de sangue frio, tenho de entreter o raciocínio com alguma coisa para me assegurar de que ele não derrete ou me sai pelos poros na forma de vapor. Mas nem preciso de me esforçar muito, geralmente o caricato vem me parar as mãos por mero acaso, não sei bem porquê.

Em primeiro lugar, gostaria de prestar tributo a todas as famílias numerosas, com um mínimo de duas cabeças de novilho bem sonantes, que calorosa e afávelmente, num raio de 500 metros de areia branca e livre, se vêm juntar de trouxa e bagagem, esteira e tupperware, ao pedacinho de tranquilidade por nós escolhido a dedo. Eu que seleciono sempre aquele lugarzinho ao sol, com um máximo de 10 cabeças por hectare, não demasiado longe da água para não queimar os pés, nem demasiado perto para não jogar o meu mp3 corrente fora quando a maré se vem, com poucos pauzinhos e urtigas para não picar e com vista sobre o nadador salvador e os seus tostadinhos peitorais. Mas para quebrar todo este cenário paradisiaco, há sempre uns inquilinos mal-vindos e mal-cheirosos, com crianças nuas e pataniscas de bacalhau num tupperware, que os malcriadões nem oferecem como cortesia de vizinhos com que os filmes americanos nos mimaram. Às vezes ainda têm o mau-carácter de se irem banhar em conjunto e pedir para dar um olhinho nas coisas. Já por muitas vezes me passaram pela cabeça pensamentos diabólicos como escrever mensagens hostis e em hebraico no quebra-vento e vandalizar as cadeiras de lona, para que saibam que não são benvindos naquela terra. E de caminho roubar uma patanisca.

Outra curiosidade que me intriga bastante, é que na praia toda a conversa se ouve. Aliás, desconfio que é nas praias que nascem os boatos e as más línguas!

Sem esquecer a mediática obra do destino que nos presegue a todos e às nossas toalhas, que no compasso de tempo entre estender o trapo e embrulhar o traseiro nele, lança sempre uma quantidade simbólica de grãozinhos de areia para decorar o estaminé.

Um momento.

Bem, adorava continuar aqui à conversa porque esta é sem dúvida uma temática com pano para mangas, mas vem aí um meteoro e o mundo precisa de mim que já o oiço chamar! Até mais!

To Be Continued....

14/06/2007

Bloco de Notas

Tema: Festividades inerentes aos Santos Populares

"Santo António já se acabou, o São Pedro está se acabar, São João, São João, São João, dá cá um balão para eu brincaaar! "

Se a minha infância alfacinha serviu para alguma coisa, acho que a música é assim!

Ora, a propósito deste mês tipicamente bem disposto e bairrista, com cheiro a sardinhas e sabores tradicionais, venho deixar aqui umas breves observações (feitas por mim numa profissionalíssima experiência de campo) para consulta pública dos mais audazes adeptos dos arraiais e devotos de Suas Santidades.

Bom Apetite!


Apontamento número 1: Nunca, jamais, em tempo algum (e todo o tipo de advérbios de tempo de igual significado) levar socas, chinelos, 'havaianas' ou qualquer outro género de calçado aberto para as imediações do Castelo, Rossio, Alfama, Graça, Bairro Alto e todos os outros potenciais núcleos de gente alcoolicamente aconchegada, em grande número e temporária e compreensívelmente sem grande noção de civismo.


Apontamento número 2: Nunca tentar alcançar o Castelo por maior que seja a vossa boa vontade. É uma traiçoeira armadilha: por questões de segurança, motins de gente dificultam o acesso, mas para os mais corajosos que ainda assim conseguem alcançar o seu destino, quando no alto das masmorras parece subitamente que se abrem fossos gigantes a toda a volta debruados a arame farpado e cheios de crocodilos e piranhas. Basicamente se chegarem lá, tão depressa de lá não saem! Poucos sobrevivem para contar a história.
Apontamento número 2, alínea a) Se porventura decidirem ignorar o apontamento número dois e ousar partir à conquista, preferir os caminhos alternativos disponíveis, tais como: Ruelas, Ruas estreitas sem iluminação, crowd surfing, escadarias vertiginosas, sargetas, andaimes e estendais. Evitar portanto áreas cuja concentração de pessoas seja superior a 5 cabeças por metro quadrado de calçada.


Apontamento número 3: Defecar previamente e em território próprio, todo o tipo de detritos fisiológicos que possam vir a representar embaraço ou ameaça. Dificilmente se encontrará estabelecimentos com sanitários operacionais e cujo tempo de espera não supere a capacidade máxima física de aguentar e armazenar a matéria fecal no respectivo orgão excretor destinado ao efeito.
Apontamento número 3, alínea a) Se por causa natural ou induzida se tornar imperativo defecar em campo, procurar estabelecimentos de ar sombrio e sinistro pouco movimentados, e ignorar todos os possíveis índices de criminalidade que possam aparentar. Em caso de pânico, usar cantos de monumentos nacionais - para eles, e espaços entre carros estacionados ou canteiros - para elas (em circunstância de inibição, pedir aos demais uma rodinha à volta e um "shhh" em coro e numa só voz.
Apontamento número 3, alínea b) Levar uma módica quantia de parte para os rabinhos mais requintados que preferirem utilizar os sanitários de uma qualquer propriedade privada e desconhecida, temporáriamente aberta ao público, ignorando todos os príncipios pelos nossos pais ensinados, tais como "nunca entres em casa de estranhos".


Apontamento número 4: Levar uma pacote de lenços de papel perfumados ou não, e/ou clinex's para limpar qualquer tipo de sujidades pontuais, tais como: vómito próprio e/ou alheio, sangria, ginja ou outra bebida própria e/ou alheia, cuspo alheio (não creio que algúem cuspa para o ar só para testar a validade do provérbio português), e todo o tipo de substâncias que representem uma ameaça para a higiene mínima de cada um. Considerar igualmente a prevenção com uma muda de roupa.


Apontamento número 5: Ter especial atenção a ocasionais surtos de arremesso de objectos, tais como garrafas, latas, copos de plástico, sardinhas, pão, bifanas, sapatos, pessoas, animais domésticos e Cocktails Molotoff. Se necessário proteger a cabeça e rezar numa das 3 religiões à escolha: Islamismo, Cristianismo ou Judaísmo.


Apontamento número 6: Procurar evitar áreas com grande quantidade de garrafas partidas ou detioradas, principalmente quando desrespeitado o apontamento número 1.


Apontamento número 7: Possuir uma, duas ou mais pastilhas de Gurosan ou Alka-Seltzer prontas a consumir e/ou partilhar. À venda nas farmácias e sem necessidade de prescrição médica.


Apontamento número 8: Em caso de se considerar a si e aos seus, pessoas facilmente seduzidas por álcool ou substâncias psicotrópicas, munir-se previamente de coleira ou chip identificadores.


Apontamento número 9: Levar trapos velhos, cabelo oleoso e desgrunhado e pintura tribal a fim de reduzir em massa os assédios. Esboçar caretas medonhas também potencializa o sucesso nesta matéria.


Apontamento número 10: Levar consigo máquina fotográfica antiga (quanto maior e mais se assemelhar com um tijolo, melhor) para que possa evitar danos a longo prazo e simultâneamente gravar os momentos memoráveis e usá-la como arma.


Apontamento número 11: Providenciar meios de comunicação eficazes e alternos ao inútil telemóvel, tais como: Megafones, telefones de copos com fio extensível até uma distância de 50 metros, tapetes para sinais de fumo, pombos correio e aviõezinhos de papel.


Apontamento número 12: Planificar antecipadamente a forma de regresso, e se necessário fazer uma vaquinha e alugar um motorista, ou munir-se de patins, trotinetas, bicicletas, burricos ou outros veículos de tracção animal. Levar agasalhos e calçado confortável para uma cómoda peregrinação até à praça de táxis vazia mais próxima, local esse que pode variar entre a Avenida da Liberdade e Campo de Ourique.



Penso que com este Kit de sobrevivência todos poderão disfrutar dos Santos Populares em condições!


Antenciosamente, Santa Fá.

22/05/2007

3º Mistério - O d'O Espelho

“Espelho mágico, espelho meu, existe alguem mais belo do que eu?

-Ya.

Era uma pergunta retórica, imbecil.

-Então porque é que perguntaste?”



Porque confiante e convencido são dois adjectivos diferentes. Um convencido dá enfase ao que ele quer que as pessoas admirem nele, o que muitas vezes elas nem sequer reparariam por si mesmas. Um convencido precisa de legendas. Um confiante tem imagem. Os que não são cegos que vejam à sua maneira, para ele tanto se lhe deu se o acham policromático ou transparente. Ele tem os negativos consigo.

O convencido procura a confirmaçao numa só voz de que ele é Hossana nas Alturas, ele é rouco e não consegue garantir isso a si mesmo. Pode até ser tudo o que deseja, mas está mais preocupado em ver as caras dos outros a admirá-lo do que virar os olhos para dentro.

O confiante sabe que tem falhas, tenta viver bem com elas. O convencido quer ser perfeito, quer ser o brinquedo mais brilhante da montra. Mas que ninguém desconfie! No fundo ele quer parecer naturalmente reluzente, ai de quem sonhe as vezes que cuspiu para o próprio braço para depois lhe dar lustre. Um convencido segue atalhos e caminhos alternos para dizer que ops! Vejam só: eu sei dizer alterno! Ele nega a sua qualidade de convencido como um judeu as suas origens em terra de ariano. Não admira, em terra de gente hipócrita, ser convencido é mau. E convencido que se preze é perfeito, qual Narciso contemporâneo.

O confiante chega a fazer-se descaradamente de convencido. Diz que é bom num minuto e diz que e merda no outro. É que ele sabe mais ou menos o que a sua casa gasta. O convencido tem uma tendência natural para o consumo compulsivo de qualidades que às vezes não digere bem.

Podia enumerar mais uma série de definições para um e para outro, mas a verdade é que no fim a linha que os separa é bastante ténue, somos confiantes até errar. Somos convencidos para corrigir os nossos erros.

Toda a gente tem um calcanhar de Aquiles. A Cindy Crawford também caga. E o Super-homem morreu à fome porque não sabia cozinhar.

02/05/2007

2º Mistério - O d'O Bombástico

Colegas de Recreio:

Gostava de partilhar aqui com vocês uma pequena reflexão sobre um pormenor que não pude deixar passar na minha condição de instruanda atenta e dedicada do código da estrada.

Estava eu em mais uma penosa hora cheia de regras, contra-ordenações, rotundas, biforcações, entroncamentos, enforcamentos, etc., empenhada em tentar lutar contra a força da natureza que me prendia ao sono e que eu afastava de 5 em 5 segundos em compasso binário no sobressalto de quem tem vergonha do cansaço (e da boca semiaberta que algum bocejo de rabo grande faz sempre questão de deixar para trás).

Nisto, entre os meus sonhos formato curta-metragem que o tempo de antena das circunstâncias apenas permitiam, houve uma palavrinha que de alguma forma ressoou no meu ouvido em ponto morto: "Explosivos".

O meu sentido de sobrevivência (ou o meu sentido satírico, que na volta são um só) trouxe-me imediatamente ao mundo dos presentes de espírito rasgando o ritmo monótono da minha cabeça.

O instrutor acabara de fazer a seguinte pergunta de teste: " O sinal A6 (projecção de gravilha) representa: A- Pavimento escorregadio; B- Risco de projecção de gravilha; C- Transporte de explosivos? "

E eu pronto, lá atirei do fundo do meu anonimato adormecido "C !!" no meu habitual tom de gozo. Depois de uns quantos risos, talvez forçados, talvez pela minha ressurreição triunfal, a aula lá retomou o seu ritmo normal. Menos eu. Eu, movida pela temática aliciante da pergunta anterior, comecei logo a desviar-me sorrateiramente do rumo que era suposto, deliciando-me com as várias interpretações que aquela alínea oferecia . Mas depois de divagar por um ou outro caminho alternativo, lá me conformei que talvez fosse apenas um espirro de creatividade por parte do autor dos testes.

A aula prosseguia não mais interessante, mas com um pouco de mais atenção da minha parte (uma vez acordado o monstro, so resta rezar ), escondida atrás das perguntas pertinentes dos meus colegas, sorrateiramente e pacientemente em pose de predadora à espera de apenas mais uma presa, mais uma frase dúbia que me saciasse o sarcasmo.

E não é que para meu espanto e surpresa, surge novamente uma pergunta:
A placa modelo nº1 deve ser colocada em veículos que: A- Sejam veículos de transporte público de passageiros; B- Tenham um peso bruto de mais de 3500 kg; C- Transportem explosivos?

... Eu gargalhei. Em solo, mas gargalhei, foi mais forte que eu. Acho que uma ou outra alma terá reparado no mesmo, porque vi um ou outro esboço de sorriso tímido entre as caras agnósticas do resto da turminha.

Bem, começo a achar que o autor destes testes apresenta sintomas de piromania.

MAS CALMA. Não satisfeito com isso, logo de seguida veio outra pergunta que já não me recordo ao certo porque ainda estava a tropeçar nas minhas gargalhadas e na ironia da situação, mas que tinha novamente explosivos a mistura.

Portanto concluo, ou Portugal é uma grande potência no mercado internacional de armas de fogo e eu não sabia, ou meus amigos, eu não sei o que é que os senhores da Direcção Geral de Viação e as suas mentes malvadas andam para aí a tramar, mas serei a única aqui a notar um certo padrão de informação duvidoso?


Convido-vos a dedicarem um pouco do vosso tempo a esta questão e estarei receptiva a novas hipóteses de interpretação.

Zelemos pela boa conduta deste país! Viva!

14/03/2007

1º Mistério - O d'O Trabalho

São 22.30. Tenho um trabalho para fazer. Tenho um texto para escrever. Tenho uma hora de aplicação pela frente. Tenho uma súbita dor óssea ao nível das mãos que me afecta as articulações dos dedos!

Suspiro.

Entretenho o raciocínio com distracções tentadoras, percorro uma série de alibis que me façam acreditar cegamente que a tarefa que tenho não é assim tão importante, para sair de fininho da sala de julgamento onde trabalha a minha consciência (ela sim, trabalha incondicionalmente. Com isto quero mesmo dizer ausência de condições).

Não quero com isto dizer que não goste do que tenho para fazer. Mas há outras coisas que gosto e que são tão mais simples que... um momento, tenho aqui um cigarro que não pode mesmo esperar!

Como eu estava a dizer, eu sei que o trabalho e o empenho são necessários para se ser bem sucedido e destacado. Mas são resultados a médio/longo prazo e o plágio, corrupção, contactos e atalhos também funcionam e todos ficam felizes. Excepto a minha consciência, mas ela entretém-se a trabalhar noutro lapso qualquer da minha postura.

Grande parte dos trabalhadores Portugueses padece desta maleita: preguiça – a antítese do trabalho. Não se esforça a 100% porque secalhar 70% chega, e em dias maus o 50% dá para o gasto. Confia-se na sorte, tal como se confia em lotarias para enriquecer. Toda a gente conhece a lei do menor esforço e é das poucas que ninguém se importa de cumprir.

Trabalho exige perseguir objectivos, exige dedicação, exige detalhe, exige atenção, exige insatisfação, exige exigência, exige presistência, exige prioridades, exige escolhas.

E ninguém pode exigir muito mais quando se trabalhou.

Como tal deixei o meu cigarro a meio e escrevi o meu trabalho, para que com tudo o que lutar subir na vida à minha custa, viver bem e não ter de fazer mais nada.

Os Mistérios

E porque a verdade e a saliva devem ser partilhadas por toda a gente, vou agora dedicar-me a essa causa e debater-me sobre assuntos para os quais formulamos inúmeras hipóteses que em vão se esfolam umas às outras para admitirem uma postura irrefutável.

Sim, também podia distribuir beijos a toda a gente, mas sofro de escorbuto .

Vamos chamar-lhes mistérios!

E por mistérios entenda-se (citando J. Almeida Costa e A. Sampaio e Melo in Dicionário da Língua Portuguesa - Porto Editora) "verdades dogmáticas ou questões Universais que a razão humana não pode compreender; tudo o que tem causa oculta ou que parece inexplicável. "

Enjoy your meal, ladys and gentlemen!

22/02/2007

Brevemente...

Caros leitores dedicados, assiduos e incondicinais, desculpem lá. Se faz favor.

Eu sei que nestes ultimos meses fiquei em falta para convosco, e que este blog caiu na merda, MAS

foi sem querer.

Já me puni bastante por castigo auto-proposto, e como tal espero a vossa compreensão e esqueçamos este pequeno espisódio, shall we?

Assim sendo volto em breve com novas drageias literárias de hortelã.pimenta para meu alívio e vosso lazer!

Beijinho, sim?

16/02/2007

Moribundamente Sociais

Ser, parecer



Entre o desejo de ser
e o receio de parecer
o tormento da hora cindida

Na desordem do sangue
a aventura de sermos nós
restitui-nos ao ser
que fazemos de conta que somos


A vida (ensinaram-me assim)
deve ser bebida
quando os lábios estiverem já mortos

Educadamente mortos

Mia Couto

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Moribundamente sociais.

O ser humano desde que o é tem como necessidade a socialização. Desde os tempos mais primordiais, que o Homem se organiza em sociedades e comunidades, tal como a maioria dos animais o faz. O convívio com os seus similares transmite segurança, conforto e certezas. Certezas essas que são os alicerces da nossa construção pessoal e da construção do nosso próprio percurso. Na oposição, a solidão e a exclusão deixam-nos desamparados, perdidos e pouco confiantes.

Assim sendo, é-nos intrínsecamente natural procurarmos a aceitação dos outros para que também nos considerem na legitimidade de aceitar quem nos rodeia. De outra forma, a nossa opinião pouco interessava. Temos a necessidade de sermos ouvidos e identificados. É uma espécie de negócio implícito que fechamos todos os dias com todas as pessoas com quem nos relacionamos.

Para nos facilitar a vida, muitas vezes usamos as cábulas que a sociedade nos vai dando, moldamo-nos aos padrões que temos a certeza que pelo menos a maioria gosta. É tudo uma questão estatística. As nossas probabilidades de sermos aceites aumentam quando respeitamos a doutrina social que nos é pregada inconscientemente a cada dia que passa.
E assim, deixamos muitas vezes a nossa essência em stand by recorrendo ao modo standard no quotidiano.

É esta qualidade de actores que vestimos todos os dias. Acabamos por projectar algo entre o que somos e o que queremos mostrar aos espectadores.

Fazemos a nossa interpretação dos papeis escritos pela sociedade, cada qual ao seu jeito.

Já o dizia o Mia: “A vida (ensinaram-me assim) (...)” . Aquilo que sabemos e tomamos como verdades resulta do que nos ditam os que nos rodeiam.

Ora não será de estranhar então que aprendamos a ser aquilo que vemos serem os nossos ditadores.


(Esperando piamente que te tenha servido de qualquer coisa D.D. =D )