05/04/2011

9º Mistério - o d'O Braço

Para aqueles que não seguem o meu percurso literário (o que representa aproximadamente o resto do mundo) e não sabem, a minha avó é um ícone na minha infância e alguém com quem tenho aprendido até hoje.


Mas há uma e uma só excepção de uma lição que eu nunca aprendi - e que eu sei que afecta a minha vida em grande escala.


Alguém me explique a máxima de vida:




“Antes isso que um braço partido”.




Eu já tentei, já me virei do avesso, já me submeti a testes-cobaia de drogas alucinogénicas e feitiços Malaios, mas acho sinceramente que não tenho capacidade espiritual para contemplar toda a beleza e essência desta frase.


É que para mim - e Deus me perdoe tamanho sacrilégio - há coisas bem piores.


Chumbei a uma cadeira - Oh filha, antes isso que um braço partido!

Vou ficar presa mais um ano, iniciar a carreira mais tarde, sair de casa aos 30 e quando quiser ter filhos já não vou estar na idade fértil, acabando os meus dias num lar a jogar bingo a bolas de Naftalina. Mas pelo menos não parti um braço. Por enquanto.


Roubaram-me a mala - Oh filha, antes isso que um braço partido!

Tinha lá a minha carteira com um boletim do euromilhões potencialmente premiado com 9 algarismos de euros e o meu iPhone - para que é que eu vou precisar dos braços agora?


Houve um terramoto e um tsunami no Japão - Oh filha, antes isso que um braço partido!

Que é como quem diz “Os outros que se fodam, o meu bracinho é que não!”


etc, etc, etc.


Mas em parte tenho de reconhecer que esta epifania tem, de facto, uma função indíscutivel: a partir daqui, o mundo torna-se um lugar bem melhor.


Ora se um braço partido é a referência absoluta do pior cenário que pode acontecer, tudo o resto toma imediatamente um carácter bem mais positivo. Acho que consigo viver num mundo em que o meu único e fatal medo será o estalido do rádio ou do cúbito. Afinal o que é um inferno em chamas comparado com isto? Depois de morrer nem sentes nada... Falecer é para meninos, pá!

11/02/2011

Observações de Campo #3


Felizmente há coisas que permanecem num plano não imediato aos olhos. Como os pés. Vê-se mesmo que foi a parte que ficou para o fim quando Deus desenhou o Homem, ou não fossem os pés a ponta mais feia do corpo humano. Muito provavelmente Ele já estaria cansado e com a mão dorida e acabou por desenhar uns rabiscos disformes e sem tinta, tal como a caligrafia ilegível que pauta o final dos apontamentos de uma aula de Antropologia, ou assim.


E como se não bastasse essa condição do nosso código genético com a qual temos de lidar todos os dias, ainda há BANDIDOS (que não têm outro nome!) que se atrevem a fabricar mausoléus em forma de sapatos para relembrar ao mundo da pior maneira que os pés, na sua aparência, existem:




Porquê? Porquê o disfemismo? Os pés já são feios que cheguem, por Cristo!

E o pior é que pegou moda. Atrevo-me a dizer que este sapato pode ser visto como o All Star da 3ª Idade. Se um homem com mais de 60 anos não tiver pelo menos um par, está condenado a ser vítima de Bullying pelos velhos rufias nos torneios de Canastra do Jardim do Príncipe Real.


Escrevam o que vos digo: se algum dia o meu pai, quando chegar à bonita década dos 60, tiver a menos bonita ideia de me aparecer com uns bibelôs daqueles nos coutos, eu juro que perco a compostura e lhe aponto uma palete de tons da Bellady à cabeça! Se ele está velho mas ainda assim pode estar na "moda", também vai a tempo de fazer umas madeixas para disfarçar as raízes, que pintar o cabelo já não é só coisa de gaja!


É que não tem lógica alguma. Ah, porque os sapatos são ortopédicos e o pai já não pode com as costas... Usaste saltos de agulha desde os 15? Aguentaste os dedos encarquilhados e os joanetes em sapatos de ponta bicuda? Então aguenta lá a escleose que os mocassins são como pantufas de caxemira de cabras da Pantene.


Por isso, cavalheiros de idade superior, deixem-se mas é de mariquices que se querem dar uso ao azulinho, reservem os sapatos ortopédicos para cunha de pés de cama e vão dar graças às dores de costas.


26/01/2011

Palavras do Dia#2

Escarlate


s. m.
1. Cor vermelha viva e rutilante; tecido que tem essa cor.
adj. 2 gén.
2. De cor vermelha muito viva.
fazer-se um escarlate: corar.



Situação

De facto, não me ocorre nenhuma. Escarlate é daquelas palavras que eu admiro mas não uso, não por medo de a profanar mas sim porque não liga bem com os meus ténis Adidas. É que Escarlate é uma palavra elegante... tão elegante que acho que só a vou usar quando tiver mais de 40 anos e vestir tailleurs. Com malas Escarlate, precisamente.


Os Critérios

O primeiro critério torna-se bastante evidente logo em 1. Uma palavra que para ser descrita no dicionário precisa recorrer a outras palavras igualmente caras como “Rutilante”, oh meus amigos! É quase tão chique como provar um champagne cuja flute é edição limitada da Atlantis!

O ponto 1. deixa-me ainda margem para uma segunda reflexão: ora se Escarlate pode ser o nome dado ao tecido que tem essa cor, isso significa que hoje quando chegar a casa e quiser limpar às mãos à toalha digo “óh filho, passa-me lá o anil que eu tenho as mãos a pingar de transparente?”.. ou isso, ou Escarlate é um substantivo tão espectacular que é o único que assimila os objectos que têm essa cor e toma a sua forma...


O segundo critério passa pelo facto de Escarlate ser uma palavra extremamente austera e selectiva. Não é qualquer um que pode dizer Escarlate. É preciso, pelo menos, comer com um guardanapo de pano no colo. Devia haver multas para o uso indevido de Escarlate, como por exemplo, para algum Ruben Nelson que dissesse que queria uma camisola Escarlate como o seu benfas. Aliás. Eu atrevo-me mesmo a dizer que, se vermelho é bimbo, e encarnado é que se diz, então minhas queques de solário e sinosite, engoli vosso botox que Escarlate é o brasão do 711C na escala Pantone, ou mesmo o pedigree dos 700nm do espectro electromagnético!


Escarlate tem ainda uma outra nuance. Escarlate tem uma leve aura de crime e pecado. Mas um pecado tão bem feito que faz inveja e dispensa Avé Marias só pelo mérito. Não sei porquê mas, o proíbido, na minha escala de cores (sim, porque eu atribuo cores a tudo) é de cor Escarlate, o que torna os crimes e os pecados muito mais tentadores, ou não lhes fosse essa uma característica própria. Por isso se eu disser que aquele homicídio encheu as paredes de sangue Escarlate, o homícidio é automaticamente promovido a obra de arte, linha essa que pode, na minha opinião, ser efectivamente muito ténue.


Por fim, não queria deixar de registar a minha profunda desilusão com o dicionário que consultei. Está aqui uma pessoa a escrever umas dezenas de linhas cheias de bom gosto e excelência, para vir um exemplo a bold dizer que pode “fazer-se um Escarlate”, assim como quem faz um filho, e esta comparação não foi aleatória. Obrigada pela graciosidade com que destruiste a pose da palavra e a puseste de quatro em frente ao mundo. Obrigada.


p.s. Como devem ter reparado, entre as Palavras do Dia#1 e as Palavras do Dia#2 passou, de facto, mais que 24h. Isso acontece porque, no meu mundo, um dia meu corresponde a aproximadamente 90 dias humanos. Por isso habituem-se!

05/11/2010

É a vida...

- Pessoalmente, eu prefiro a minha beleza natural!
- Bem, mas para isso, primeiro a natureza tinha de ta ter dado.

...

27/10/2010

Palavras do Dia #1

Pestilento
(latim pestilentus, -a, -um)
adj.
1. Que é relativo a peste.
2. Que provoca ou transmite peste.
3. Que exala um mau cheiro muito intenso.
4. Fig. Que corrpompe, danifica.

Situação
Na maior parte das vezes utilizo-o como em 3. - ex: "Que homem pestilento!!"; "Cheira a vomitado pestilento"... etc, etc.

Para além de ser um insulto elegante, Pestilento confere um dramatismo fabuloso aos cheiros. Um carácter quase fatal quando sujeito a um grande período de exposição. E é masculino. Se fosse feminino seria Fétida, palavra essa que também gosto, mas fica para outro dia, quando encontrar uma mulher fétida no metro como encontrei hoje um homem pestilento. Não deve ser difícil, de facto...

Os Critérios
Pestilento é uma palavra grande. Palavras grandes, por norma, ganham logo vantagem à pequenas, mais não seja por demorarem mais tempo a ouvir. E tem muitas consoantes diferentes, exige automaticamente destreza na dicção. Além disso, é pouco comum no vocabulário actual, no entanto com potenciais aplicações na gíria popular, senão vejam só: "Que chulé pestilento!" - o chulé sobe logo de nível. É lindo...

Pestilento é também uma palavra cara. Qualquer tia diria pestilento em vez de mal-cheiroso, mesmo que o mau-cheiro fosse só de um arrotinho, banho de dois dias ou uma coisa pouca. E carregando no "-lento".

Para finalizar, Pestilento é ainda uma palavra que remete ao arcaico. Mais não seja pelo ponto 1. e 2. que aposto terem sido moda na idade média.

Posto isto, está argumentada a minha eleição de Pestilento como Palavra do Dia#1. Mas bastava dizer que gosto.

04/10/2010

Reflexão

Se, hipoteticamente, o Freeport Outlet tivesse uma loja de animais, isso significaria que vendiam porquinhos da índia velhotes? Ou peixinhos às portas da morte?