11/08/2006

Música para os ouvidos e não só!


E porque temos de ser uns p'rós outros, aqui fica uma sugestão musical para os amantes do chillout e boa música em geral. Esta não é música qualquer, é música compreensível, isto é... não que toda a gente compreenda, mas sim para ser compreendida por quem consiga.

As notas ideais para acompanhar uma salada ou uns petiscos numa esplanada agradável na praia, num fim de tarde de Verão... Hmmm....

Nitin Sawhney, uma mistura genial de culturas, música electrónica e tradicional de vários cantos do mundo, com uma pitada de acid jazz em alguns temas, numa onda chill estremamente transportadora... uma delícia para os ouvidos e para a cabeça!

09/08/2006

Qual.idade de Vida


Qualidade de vida. É um tópico atraente, sem dúvida. Atira-nos imediatamente a mente contra o nosso conceito de conforto e bem-estar. Mas é um tópico com conotações várias, para pessoas várias e estilos de vida variados. Ou avariados, chama-lhe o que quiseres. Porque hoje em dia, se há pessoas que fazem da vida um processo sistemático e robotizado em que os dias seguem uma sequência e com.sequências sem essência, parece-me a meu ver que para esse conceito pragmático de dia-a-dia, esperava-se resultados mais saciantes que um SLK estacionado à porta de casa na Brandoa. Portanto deve haver uma avaria nesse sistema mecânico, sim.
Era uma, duas ou três vezes (ou muitas mais) um senhor, vamos chamar-lhe Zacarias, sem ofensa aos Zacarias de Portugal e arredores mas foi o primeiro que me ocorreu.
O Sr. Zacarias era um empresário de sucesso, cheio de dinheiro, workaholic, alcoólico, com 3 filhos mas pai de nenhum deles (não por culpa da mulher que desprezava mas pelo desprezo que lhes dava), ausente, imponente, deprimente. Enfim, o ideal utópico de marido, o protótipo de qualquer mulher, esposa ou dona de casa. Eu inclusive era capaz de largar tudo e correr para os braços de um homem assim, como o Sr. Zacarias.
Um dia perguntei ao Sr. Zacarias se ele tinha qualidade de vida. Ele disse que sim de barriga cheia. E eu disse “… ‘Tá bem.” E então pensei eu com os meus botões, sim porque nós pensamos muitas vezes juntos, qual seria o conceito de qualidade de vida do Sr. Zacarias. E decidi perguntar-lhe num jeito retórico, já à espera de uma resposta bem valorizada na bolsa internacional, com gastos de envio mais IVA. E assim foi, o Sr. Zacarias respondeu: “ Miúda, eu tenho um SLK à porta de casa, um plasma na sala, um apartamento em Vilamoura, um iate topo de gama, um cargo importante na empresa, e um ordenado chorudo… O que é que eu posso querer mais?” e eu disse “…’Tá bem.”. Não quero parecer muito repetitiva nem simplista, mas porra… é que fico sem palavras! Toda a minha filosofia de vida e todos os meus valores são diminutos ao pé de uma visão tão enriquecedora e tão bonita deste queijo suíço a que chamam vida.
E o Sr. Zacarias, para rematar e acabar em beleza ainda acrescentou: “Se isto não é qualidade de vida… então não sei o que é!” e eu pronto! 2-o para o Sr. Zacarias. Este homem não dá hipótese. Ele sabe perfeitamente o que é qualidade de vida e eu que pensava que era feliz, não tenho o SLK, portanto sou uma merda e a minha vida cheira mal.
Um dia o Sr. Zacarias teve um pequeno desentendimento com o patrão que era tão ou mais cabrão do que ele, e então o Sr. Zacarias foi descartado como as fraldas sujas do meu irmão, e o seu pequeno império de felicidade ficou hipotecado até à sua mãe, mulher e filhos, que o deixaram pendurado com a sua qualidade de vida guardada num banco qualquer. O que me consolou foi o facto de o meu queijo suíço mal cheiroso ainda ser meu. O Sr. Zacarias nem os restos, o que me dá uma certa imagem de rato de esgoto. Não sei.
Já eu, por exemplo, passei os últimos 6 dias a dormir 3 horas por noite, a comer 2 vezes ao dia, a encontrar bichezas 6 vezes por minuto, a ser picada 8 vezes por hora, a ir à casa de banho uma vez por dia e outras tantas coisas em proporções pouco convidativas, como a razão de atum para a quantidade de outros alimentos que deve ter sido algo como 6/2, ou coisa que o valha. Passei 6 dias a dormir em posições pouco ergonómicas, a lavar-me em chuveiros pouco higiénicos que concentravam motins de gente suja lutando com a própria vida e arrancando olhos por 10 minutos de água canalizada, a defecar em pliê e malabarismos similares de alto grau de dificuldade, a suportar temperaturas vulcânicas às 9 da matina, multidões que se atropelavam por meio metro quadrado de autocarro, e um rol imenso de adversidades várias. Quando voltei ao conforto metropolitano do meu lar, quase que beijei as porcelanas da casa de banho, idolatrei a suave textura do piaçá, senti o aroma a desinfectante, levitei na minha cama perfeitamente horizontal, dei graças pelas bolachas Maria na dispensa, e pelo chá de hortelã-pimenta na chaleira, derreti com o cheirinho a pão quente pela manhã, e comidas caseiras com uma pitada de carinho maternal. O fresco do ar condicionado tinha um efeito quase orgásmico, e a água do duche parecia uma fonte celestial. De facto todo o conforto do lar nos dá uma sensação de bem-estar incomparável. Mas na manhã seguinte já sentia falta dos risos, falta das pessoas, falta da música improvisada em cima de um joelho e na ponta de um cigarro, falta dos desconhecidos que se juntavam para um serão partilhado sem pedir nada em troca, falta das fotografias, falta dos abraços, falta das olheiras, falta do sol alentejano, falta das vozes e das gentes, falta do festival, falta da festa, tudo faltava menos as recordações.
Fui à praia, vi o pôr-do-sol, vi o mar, vi a areia, vi os reflexos daqueles dias no mar da Estremadura. E vi que a diferença de me sentir confortável, era uma migalha do meu pão saloio com queijo suíço. Era um pedacinho de bem-estar na minha qualidade de vida. A sensação que vinha da praia, do pôr-do-sol, do mar, da areia daqueles dias loucos e alentejanos ou dos dias calmos da Estremadura, era a mesma. O bem-estar residia nas pessoas, nos cheiros, nas experiências, nessa cangalhada toda que nos aquece a alma cá de uma maneira… Qualidade de vida, para mim, não são carros e casas de banho esterilizadas… qualidade de vida é vivê-la confortável na sua personalidade, nas coisas que mais gostamos, nas coisas saudáveis, nas pessoas, nas experiências, nos sabores e nos cheiros, nas imagens, nas recordações, nas pitadas de hortelã-pimenta, é ter uma idade cronológica e uma idade espiritual diferentes. Ou ter a mesma idade cronológica e espiritual mas vividas segundo a segundo. É perguntar Qual.idade é que temos e não saber responder ao certo. É ir comendo o queijo suíço com as seus buracos e falhas, mas saber-nos bem à mesma. É isso tudo e pronto. Tenho dito.